segunda-feira, 17 de março de 2008

Estratégia: combater os problemas acrescentando vida e não morte

Desde 1970 a fazenda Santo Antônio da Água Limpa cultivava café adensado, utilizando agrotóxicos como inseticidas (tiodam), herbicidas e adubava-se a terra com fertilizantes químicos.
Em 1990 o professor Jorge Abrão veio visitar a fazenda e analisar o maior problema que eram as brocas - Hypothenumus hampei. A broca é um pequeno besouro (coleóptero), que possui como estratégia reprodutiva, a perfuração do grão de café pela fêmea que constrói no interior do grão de café uma galeria onde deposita os ovos, que irão eclodir e virar larvas que se alimentam do café.

Ciclo de vida da Broca

O pesquisador andou pela fazenda com uma lupa e um pequeno microscópio, analisando os grãos de cafés, as folhas e o solo. Terminando as analises o professor Jorge Abrão disse que não era necessário utilizar mais o tiodam (endolsufan – inseticida e fungicida) para combater as brocas. Então João Neto, gerente da fazenda, com a cabeça de um agricultor convencional, perguntou qual agrotóxico ele deveria usar? O pesquisador respondeu que ele não precisaria utilizar mais nenhum tipo de agrotóxico, que no cafezal tinha bastante broca, mas também existiam os inimigos da broca. Passando o tiodam matava-se as brocas que estavam fora do café e os inimigos da broca, mas não matava os ovos e as larvas das brocas que estavam dentro do café, assim quando estas saiam não encontravam mais inimigos e conseguiam se reproduzir bastante.
João Neto ainda não estava convencido, na época a fazenda Santo Antônio da Água Limpa era rodeada de fazendas de café, existindo então a preocupação das brocas dos cafezais vizinhos passarem para a fazenda, mas o professor Jorge Abrão falou que aconteceria justamente o contrario. Ao passar o tiodam os fazendeiros vizinhos estavam matando as brocas que estavam fora do café e também os inimigos da broca, desta forma se João Neto, não utiliza-se mais nenhum tipo de inseticida, as brocas de sua fazenda iriam passar para as fazendas vizinhas aonde não haveria inimigos.
João Neto ficou pensando, e apesar do medo resolveu acreditar no professor Jorge Abrão e não mais utilizar inseticidas. No primeiro ano a quantidade de broca nem aumentou nem diminuiu, no segundo também permaneceu estável, no terceiro ano diminuiu um pouco, mas ainda nada significativo, mas foi diminuindo cada vez mais. Apesar da maioria das fazendas vizinhas terem mudado sua cultura para cana de açúcar e eucalipto, aconteceu justamente o que o professor Jorge Abrão previa, as brocas da fazenda Santo Antônio da Água Limpa é que passam para os poucos cafezais restantes. Hoje em dia, sem utilizar nenhum tipo de fungicida ou inseticida, continua existindo broca, mas em quantidade muito menor, aproximadamente 1% do que existia antes.

A segunda experiência positiva do resultado de acrescentar vida para combater os problemas aconteceu em 2000. Desde 1996 que não era utilizado nenhum tipo de adubo, fertilizante ou agrotóxico na fazenda Santo Antônio da Água Limpa, porém quando parou-se de utilizar herbicidas o “mato” começou a crescer muito (capim-anapie, capim-colonião, capim-braquiaria, capim-angola, grama seda, entre outros.....), encarecendo bastante o manejo da fazenda, que necessitava de muitos trabalhadores para capinar e roçar o cafezal.
Segundo João Neto era um trabalho sem fim, quanto mais cortava o mato mais ele crescia, em muitas partes da fazenda o “mato” venceu a luta e matou os pés de café, foi então que decidiu-se plantar e deixar que outras arvores crescessem naturalmente no meio do cafezal. As arvores fazem sombra e diminuem o crescimento do “mato”, além da proporcionar um ambiente mais adequado ao desenvolvimento dos pés de cafés que são nativos do sub-bosque das matas úmidas da Etiópia.
Em 2003 aconteceu uma nova mudança, apesar do objetivo da fazenda ser a formação de uma agrofloresta, o crescimento das arvores é relativamente lento e o mato continuava crescendo muito e matando o cafezal. Quando tornou-se impossível continuar combatendo o mato através da capina e da roçada, João Neto decidiu colocar bovinos e eqüinos no meio do cafezal, para controlar o crescimento do mato. Atualmente ao invés de gastar dinheiro pagando trabalhadores para roçar o cafezal, a fazenda obtém receita através do aluguel de pasto para terceiros, que engordam bovinos e eqüinos de excelente qualidade.
Além de auxiliar no controle excessivo do mato o gado proporciona uma melhor atividade microbiana e de pequenos animais no sistema, contribuindo também para o aumento da biodiversidade.
O controle dos bernes e carrapatos é feito da maneira mais natural possível, os animais tomam doses mínimas de homeopatia, as garças (Egretta thula) ajudam comendo carrapatos da pele do gado, sendo outro beneficio adquirido através da alimentação, pois existe muita arvore de Pau-d’alho (Gallesia integrifolia) que o gado adora comer e acaba funcionando como inseticida natural.